< Registro: 28, categoria: Aconteceu Comigo />
Quando eu tinha 8, 9 anos morávamos eu, meu irmão 4 anos mais novo, minha mãe e meu padrasto, num apartamento térreo, com outro em cima. Era um prédio que havia passado, recentemente, por uma grande reforma, porque o dono ia se casar e ia morar no apartamento de cima. Nossa vida transcorria sem grandes problemas quando a minha mãe adoeceu inexplicavelmente. Ela começou a ter inúmeras lesões em ambas mãos, lesões tão profundas que não existia mais pele, ficavam em carne viva.
Como a mais velha, apesar de criança ainda, cuidava da minha mãe. Dava banho, comida na boca. Minha mãe chorava inconsolavelmente. Primeiro, porque os médicos não descobriam o que ela tinha, segundo porque ela sempre foi uma mulher ativa e estava, praticamente, inválida.
Desesperada, sem mais onde e a quem recorrer, minha mãe apelou para a religião. Ela, assim como todos nós, foi criada na religião cristã-evangélica, mas minha mãe simplesmente esqueceu disso, e procurou ajuda em centros espiritas e de candomblé.
Antes de continuar a história, quero esclarecer que o que aconteceu nada tem a ver com esta ou aquela religião, nem quero polemizar. Apenas contarei os fatos como lembro.
Uma noite fomos a um ritual. Eu odiava aquilo. Toda aquela gente com roupas típicas, velas, incenso e um batuque ensurdecedor. Na porta, minha mãe conversa com um dos participantes e ele indica um pai de santo. Eu estava do lado de fora, e para entrar tive que tirar os sapatos. Engraçado que não estava assustada. Estava com raiva por estar ali. Minha avó tinha me criado e ensinado que nossa crença era outra. Senti que a estava traindo.
Entrei com a minha mãe naquele lugar, com as mãos dela vermelhas, sangrando.
Ela sentou num banquinho e um homem de branco, cheio de guias, fumando um charuto ficou diante dela. Fiquei só olhando aquilo. Ele fecha os olhos, dá umas baforadas, fica murmurando hummm hummm.
De repente, arregala os olhos e grita:
— Sai daqui, sai daqui! Seu caso não é comigo! Seu caso é para o Deus-Vivo!
Saímos de lá. Minha mãe arrasada. Ela se recusava a procurar a minha avó. Elas haviam brigado seriamente e dentre os motivos do desentendimento estava justamente, a nossa crença. Mas o pior estava ainda por vir. Com a minha mãe impossibilitada de fazer qualquer coisa, a mãe do meu padrasto foi morar lá em casa. Havia um quarto independente, grande, onde minha avó (eu a considerava assim) se alojou.
Foi um inferno. Meu padrasto se desdobrava para cuidar da casa, minha mãe estava cada vez mais desesperada, a minha avó se metia na vida deles.
Ensinaram a minha mãe a acender velas para o anjo da guarda. E ela fazia isso todas as segundas feiras sempre comigo junto. Sempre acendia debaixo do tanque, na área de serviço. Enquanto isso, minha mãe foi encaminhada para o Instituto Oswaldo Cruz, para o centro de pesquisas porque nenhum medico diagnosticava o que ela tinha nas mãos.
Nessa roda viva, de brigas, discussões, doença, meu padrasto estava enlouquecendo.
Um dia, após outra briga violenta entre minha mãe, meu padrasto e a mãe dele, ele saiu de porta afora, e enfartou na porta de casa. Ele só tinha 32 anos. Eu o vi cair no meio da rua, corri pra lá desesperada, chamei os vizinhos. Felizmente não foi fatal. Ele teve sorte de sobreviver.
Neste dia, minha mãe teve um acesso de fúria, quebrou tudo dentro de casa, inclusive as velas que ela acendia. Enquanto ela quebrava tudo, vultos, gritos, lamentos e choros eram ouvidos pela casa. Os “espíritos” imploravam por velas, por luz. Minha mãe gritava com eles, dizendo que não ia acender mais nada, para eles irem embora de lá e ia quebrando tudo. Eu me escondi atrás da cama e fiquei lá assustada demais para fazer qualquer coisa.
Vocês já viram um incêndio de perto? É algo assustador e fascinante de assistir. O fogo se alastra numa velocidade impressionante. Lambe paredes, portas, teto. Faz um barulho assim uhhhhh, uhhhhh e estala. E sufoca. E queima. E hipnotiza. A casa estava pegando fogo rapidamente. Ouvi batidas na porta ou era na janela. Não lembro bem. Só sei que quando a porta se abriu o fogo aumentou ainda mais e uma figura de mulher se aproximou de mim, me envolveu nos braços e me tirou de lá. Eu estava semiconsciente. Será que sonhei? Quando dei por mim estava na ambulância e minha mãe histérica gritava do lado de fora. Meu irmão havia desaparecido.
O que aconteceu é que meu irmão, que é uma peste até hoje, pegou meus cadernos de escola, e tacou fogo em baixo do sofá onde eu dormia. Quando ele viu o fogo se alastrar, fugiu. E se escondeu quando viu os bombeiros e a policia chegando. Achou que seria preso. O que levaria uma criança de 4 anos fazer algo assim? Ele não sabe responder até hoje.
A casa ficou completamente destruída, mas minha mãe tinha guardado muitas caixas da mudança no quarto do lado de fora. Isso foi a nossa sorte. Muita coisa se salvou por este motivo.
Ainda tivemos que ficar na casa incendiada porque não tínhamos onde ir. Faltavam alguns dias ainda para nos mudarmos.
No dia anterior da nossa mudança eu estava empolgadíssima. Minha gata tinha dado crias, 8 gatinhos, lindos, fofos. Arrumei uma caixa grande e conforme iam nascendo eram depositados lá. Foi o meu primeiro contato com o milagre da vida. Eu não dormi, assistindo o nascimento deles.
Devia ser umas 3 horas da madrugada e meus pais aproveitaram e foram terminar de arrumar a mudança. O caminhão sairia pela manhã. Minha mãe disse que eu teria que deixar os gatinhos na antiga casa, até eles crescerem um pouco porque eles eram bebezinhos não poderiam ir conosco. Prometeu que viríamos buscar uns dias depois.
De repente, aconteceu algo incrível e aterrorizante. Uma ratazana entrou em casa. Foi uma correria. Meu padrasto pegou uma vassoura e foi atrás dela. Vi algo que jamais esquecerei. A ratazana ficou de pé nas duas patas, e avançou no meu padrasto. Ele estava com um casaco de lã (era inverno) e agarrou nele. Mordeu a primeira vez no dedo. Meu padrasto era um homem grande, alto e forte. Jogava a ratazana longe e ela avançava de novo nele e mordia.
Eu subi na mesa da cozinha, gritando com medo e nojo. A ratazana devia estar endemoninhada ou com hidrofobia. Ela entrou no quarto do lado de fora, pegou os gatinhos recém nascidos um a um e matou todos. Não houve tempo de fazer nada pelos filhotes A minha gata se engalfinhava com a ratazana, mas ela conseguia pegar os gatinhos pelos dentes, sacudia e matava. Era sangue pra todo lado. Miados, gritos. Quem tem gato sabe como os miados parecem lamentos. Eu assisti tudo de cima da mesa gritando e chorando por causa dos meus gatinhos.
Amanhecia quando finalmente a ratazana saiu pela porta. Eu fiquei lá, em cima da mesa, chorando pelos meus gatinhos. Meu padrasto foi para o hospital pela segunda vez em menos de um mês.
Mudamos no mesmo dia. Nunca mais vi minha gata nem voltei naquela casa.
Algum tempo se passou. Um dia, cheguei da escola e minha mãe estava lavando louça.
Foi quando me dei conta que as mãos dela estavam curadas, sem lesões! Ninguém havia notado isto nem ela mesma. Simplesmente sumiram.
Não sei o que havia naquela casa, nem porquê queriam que mudássemos de lá. O prédio incendiado foi demolido e outro foi construído no lugar. Nunca soube-se de qualquer outro incidente.
De vez em quando me pergunto: são os lugares que moramos ou somos nós que provocamos estas manifestações? Ainda não sei responder.
< por: Adriana /> < Postagem original publicada em 14/06/2012 ás 22h18 no Aposentado Blog Histórias Sobrenaturais />