< Registro: 17, categoria: Aconteceu Comigo /> Como muitos de vocês sabem minha família veio de Sto. Antônio de Pádua. Minha avó, uma sueca belíssima, havia ficado viúva de meu avô, que era médico e morreu precocemente aos 43 anos de idade.
Minha avó veio para o Rio de Janeiro, por volta de 1950, com 10 filhos, com idade entre 17 a mais velha e 6 anos, que era a minha mãe. Vovó contava muitas estórias da fazenda em Pádua, onde meu avô quase nunca estava, visto que era metido em política e era o único medico das cidades circuvizinhas, tais como Itaperuna, São Fidelis e Miracena, região norte do Rio de Janeiro. Contava sobre as noites de lua cheia onde os cavalos da fazenda ficavam enlouquecidos, relinchando, galopando em volta da casa grande, desesperados, sendo montados por coisas-ruins.
Os cães latiam sem parar, naquelas noites de horror. Não sabia-se, ao certo, o que acontecia lá fora. Vovó juntava os filhos todos à volta dela, se ajoelhavam e oravam a Deus pedindo proteção. Alguns dos meus tios menores se escondiam debaixo da cama, e fechavam os olhos, de tanto medo. Só abriam quando tudo acalmava. A casa grande, assim como a maioria absoluta, era de telhas, e os tijolos não eram muito bem cimentados, em muitos locais haviam buracos onde passava luz. Ouviam algo correndo por cima das telhas, afundando, quase quebrando num barulho ensurdecedor.
Pelas frestas da casa viam-se sombras passando, correndo, um rugido infernal. Vovó era cristã e criou todos os filhos tementes a Deus, mas tb acreditava, assim como todos da roça, em criaturas sobrenaturais, como curupira, saci, mula sem cabeça.
Os cavalos voltavam pela manhã, exaustos da corrida, com a crina tão trançada que minha mãe contava que precisavam de muitos dias até as tranças se desfazerem todas. Para os olhos e ouvidos dos meus tios, ainda crianças, devia ser mesmo aterrorizante.
Quando a família veio para a capital do RJ, estabeleceram-se num local, que naquela época, era uma fazenda enorme, praticamente desocupada, em Bonsucesso, onde atualmente é o Complexo do Alemão.
Meus tios e minha mãe cresceram, achando-se livres daquelas noites de Pádua. Acharam que o haviam deixado para trás , que o problema estava na cidade natal.
Ledo engano.
Acabaram descobrindo que não era a cidade. Era a família, inclusive a nova geração, onde me incluo, que atraía esses eventos sobrenaturais e inexplicáveis.
A casa da vovó era uma delicia. Pobre, de telhado, banheiro do lado de fora. Mas havia muito amor. Fomos criados todos juntos, primos e primas, como irmãos. Eu era uma criança especial para a minha avó. A preferida dela. Talvez por não ter tido pai, minha avó me amou e me protegeu mais que a todos os outros netos, e eles eram muitos. Fui criada por essa figura forte e enérgica, que comandava a família com mãos de ferro, e ao mesmo, tempo tão doce e amorosa.
Conforme eu ia crescendo entendia porque vovó era tão procurada e respeitada pelas pessoas. A via pondo as mãos nas pessoas doentes, em crianças, velhos e ficavam curados. Usava azeite nas feridas e abençoava. Eu não entendia muito bem, era muito pequena ainda, só muito mais tarde compreendi que minha avó tinha o dom da cura. E ela tb "via" coisas, mas isso era segredo. Esse tipo de assunto era proibido ser falado perto das crianças. mas eu era curiosa e inteligente. Sabia que minha avó era especial. Só não sabia que seus dons eram partilhados comigo.
A casa da vovó era pequena em comparação ao terreno. Ficava (até hoje esta casa existe) no alto de uma rocha, próximo a um pequeno riacho. Era térrea e apenas um quarto.
Em cada cômodo havia janelas de madeira, tipo veneziana, cujo trinco era daquele que girando um pedaço de metal entrava num buraco feito no parapeito mesmo. O telhado era feito de telhas de barro e algumas eram transparentes, que eram comumente usadas para passar claridade.
Aquela casa era meu lar.
Um dia estava eu brincando sozinha na sala, vovó devia estar no quintal (terreiro como ela falava) lavando roupa. Do nada me levantei e subi na janela da sala, que dava pra um corredor que era fechado pela parede da casa do meu tio.
Qual não foi a minha surpresa, olhei para baixo, não existia a casa do meu tio. Havia uma descida, um caminho de terra, que descia até o fim da casa.
Eu devia ser mesmo muito palerma, porque não me dei conta que aquilo não existia e nem chamei por ninguém. Apenas fiquei olhando aquele novo pedaço da casa.
Ao observar bem, vi três montinhos de terra, como se tivessem enterrado pessoas. Eram realmente três túmulos. Eu estranhei, mas não sei por que continuava a olhar.
Foi quando vi um daqueles monte de terra se mexer. E uma mulher levantou-se de dentro da terra.
A mulher levantou-se, vagarosamente... Suas roupas estavam cobertas de pó, rasgadas, seus cabelos desgrenhados. Esta mulher não havia me visto, estava na estrada abaixo da casa.
Ela pôs-se de pé, de costas para onde eu estava. Não sei se falou alguma coisa mas a terra em cima dos outros dois túmulos também se moveram e mais duas mulheres, semelhantes a primeira, saíram de dentro deles.
As três nada falaram. Ficaram um tempo paradas. O estranho é que tudo era devagar. Como em câmera lenta. E daquela maneira lenta se viraram todas as três ao mesmo tempo para onde eu estava, me encararam com aqueles olhos mortos mas maliciosos e começaram a subir, arrastando-se na estrada, em direção a janela onde eu estava, ainda, observando.
De repente, parece que acordei. Sabia que elas queriam entrar na casa da vovó. Aflita, corri na porta e vi minha avó ao longe, no portão com alguém. Também sabia, não sei como, que enquanto a minha avó não voltasse eu não tinha que lutar com aquelas criaturas mortas-vivas, apenas tinha que impedir a entrada delas na casa. Só ela podia resolver aquilo. Era isso que martelava na minha cabeça. Fechar tudo, impedir a entrada até vovó chegar. Só ela podia resolver aquilo.
Comecei a fechar tudo. A porta da frente, as janelas dos quartos, a porta da cozinha, e de vez em quando olhava pela janela da sala para ver se elas já estavam chegando. Era um frenesi, um afobamento, e cada vez que olhava pela janela e elas se aproximavam cada vez mais, bem devagar. Fui ao quarto da minha avó fechar a janela e quando voltei para a sala já podia ver as cabeças daquelas coisas. Corri para a janela da sala e tentei fechar o lado esquerdo primeiro, quando a cabeça de uma delas impediu. Abri um pouco mais e empurrei a cabeça pra longe e fechei ao mesmo tempo puxei o lado direito. Foi quando aquela primeira mulher que se levantou da cova me olhou zangada e segurou no meu braço.
Uma dor cortante me invadiu. Aquela mão tinha tanta força!!! Puxei o braço varias vezes até finalmente me soltar e fechei a janela totalmente. O tempo todo ficava esperando minha avó voltar e pensava, sem parar: "Só tenho que mante-las fora da casa. Até minha avó chegar. Só ela pode resolver isso".
Engraçado é que a casa da vovó parecia ser muito maior e ter mais quartos e janelas e portas a serem fechadas. Eu continuava fechando tudo sem parar. E parecia que as três mortas-vivas estavam a um passo de entrar na casa, quando eu conseguia trancar tudo, no ultimo segundo.
Foi quando lembrei de fechar uma porta (que não existia na casa) que ficava entre a sala e a cozinha. Também era uma porta de madeira, com venezianas, onde se puxavam dois lados e o mesmo trinco de girar. Cheguei nesta porta e puxei os dois lados. Quando girei o trinco, olhei pelas venezianas e vi os pés das criaturas já dentro da cozinha!!!! Ainda olhando pelas frestas das venezianas vi desistirem de entrar por ali e as vi se arrastando para fora da casa na tentativa de entrar por outro lugar que não estivesse trancado.
Foi quando duas mãos me seguraram por trás. Gritei apavorada e desmaiei.
Quando dei por mim, estava na cama com a minha avó ao meu lado. Segurando nas minhas mãos e orando..
Ela me passava azeite (diz-se unção) pelo corpo todo, principalmente na testa.
Ela falava alto, numa língua desconhecida, só entendia algumas palavras em português no meio das frases.
Na mesma hora me senti segura e não sabia explicar o que havia visto. Eu estava tão confusa que nem perguntei a ela o que tinha acontecido comigo.
Quando ela terminou as suas orações, me deixou na cama dela, com velas acesas e um lampião pendurado no teto (naquela época não existia luz elétrica na casa) e saiu.
Ouvi minha avó varrendo a casa, ainda falando naquela língua estranha e quis olhar. Engatinhei em cima da cama e olhei pela porta. O chão da casa toda estava coberto de terra!!!!
Ela varria a terra para fora de casa e a cada varrida ela repetia uma frase que soava mais ou menos assim:
Ghadata aletera parsin!!! Ghadata aletera parsin!!!
Moeratera quateroyzare vateletri!!! Moeratera quateroyzare vateletri!!!
Nem me perguntem o que significava mas era um ritual de limpeza. Já era noite feita e meus tios começaram a chegar do trabalho quando viram minha avó fazendo aquilo, nada disseram. Apenas me olharam e menearam a cabeça. A partir daí os cuidados aumentaram comigo. Nunca ficava sozinha. Sempre tinha um tio ou primo mais velho comigo.
Nunca soube o que foi aquilo e minha avó nunca disse nada. Nem minha mãe falou uma palavra sobre isso. Eu ficava perdida sem saber o que pensar mas graças a Deus, criança esquece de certas coisas.
Só lembrei disto depois que minha avó morreu.
De vez em quando eu sonho com ela e continuo sentindo, quando estou com ela, a mesma segurança que sentia quando ela estava viva.
< por: Adriana />< Postagem original publicada em 18/04/2011 ás 12h30 no Aposentado Blog Histórias Sobrenaturais />